Moradores de Jacuípe vivem em permanente estado de alerta

Moradores de Jacuípe vítimas das enchentes que atingiram o município em 2010 ainda residem em áreas de risco e tentam, até hoje, se recuperar do dia em que rapidamente viram a cidade e suas vidas imersas, literalmente, no afluente do Rio Una. Seis anos depois de um dos maiores desastres naturais que atingiram os estados de Alagoas e Pernambuco, famílias ribeirinhas continuam em alerta sempre que chove na região, quando o nível do Rio Jacuípe sobe e a água barrenta invade o interior das casas situadas às margens das águas fluviais.

Atualmente, o modo que encontraram para lidar com a possibilidade de uma nova tragédia daquele porte foi a improvisação de estruturas em cima das casas, que possam suportar e salvar os pertences mais básicos para a sobrevivência, ou então contar com a ajuda de outros moradores que moram em terrenos acima do nível do rio e a boa vontade do poder público em ceder galpões onde, geralmente, se amontoam desabrigados.

Foi o que a dona de casa Rubenice Maria de Lima, de 45 anos, fez na própria residência. Com pedaços de tábuas e madeira velhos, a família conseguiu montar uma espécie de ‘sótão’ abaixo do telhado, para onde vão geladeira, sofá, televisão e outros pertences que perdem a utilidade quando em contato com a água. “Foi o jeito que a gente achou para tentar salvar alguma coisa, caso aconteça de novo uma enchente daquelas”, contou. A casa ainda guarda as marcas do cenário desolador na cidade em 2010, quando a água do rio, dentro das residências, subiu cerca de dois metros. Por todos os cômodos há rachaduras e infiltrações, o que compromete a vida dos moradores.

O quintal de Rubenice fica a menos de um metro de distância do Rio Jacuípe e, segundo a dona de casa, é de onde vem o único aviso para que providências sejam tomadas imediatamente. “Quando chove três dias seguidos, o rio já fica cheio e aí a gente fica com medo, a água já chega ao portão. Então já temos que agir, porque quando a enchente aconteceu, tudo foi muito rápido, a água vinha forte demais, arrastava tudo”, lembrou, com pesar. Segundo a dona de casa, quando a casa começa a encher, é hora de sair com a família e procurar um abrigo até que toda a lama cesse. “Já corremos para escolas, galpões e até para dentro de um ônibus. É um aperreio. Onde a água não chega, a gente vai”, desabafou.

Seu Diógenes Raimundo de Oliveira, de 73 anos de idade, também foi uma das vítimas das enchentes de 2010 e carrega sequelas do desastre até hoje. O idoso aposentado contou que já viu duas vezes o mesmo cenário em Jacuípe, onde mora há mais de 50 anos. “Em 2000 também teve uma enchente aqui, perdi tudo nas duas vezes. Não tenho geladeira, mas perdi o que tinha, televisão, cama, mesa, colchão, tudo. Só não perdi a vida. Mesmo assim, depois do que aconteceu em 2010, não tenho mais saúde. Tenho alergias que não tinha e um problema no pulmão”, detalhou, ao entrar no barraco em que vive e apontar, na ponta dos pés, para a marca da água do rio ainda nas paredes.

Conjunto habitacional não contemplou todas as famílias

Na vila em que Seu Diógenes mora desde 2010 tem, hoje, novos moradores. Muitos que moravam ali, segundo a proprietária do terreno, Maria das Neves Feitosa, foram contemplados com novas casas, no Conjunto Amaro Félix – 288 casas construídas pelo Programa Reconstrução, da gestão estadual anterior, por meio do Programa Minha Casa Minha Vida, do governo federal. No entanto, o aposentado, assim como Rubenice e outras famílias que residem às margens do Rio Jacuípe, considerada uma área de risco pela Defesa Civil Estadual, não receberam novas casas, mesmo cadastrados pela prefeitura.

A diarista Selma Maria da Silva, de 33 anos, mãe de quatro filhos adolescentes e também residente em área de risco, contou que se cadastrou no programa para receber a casa e chegou a morar no Conjunto Amaro Félix por três meses, mas a residência foi tomada pela Caixa Econômica Federal. A família de Selma foi uma das cerca de 40 que ocuparam, em julho de 2013, as casas até então inabitadas do conjunto.

“Eu me cadastrei e não entendi porque não fui contemplada, porque estava tudo certo. Então, decidi participar da ocupação e levei tudo para lá. A gente estava morando em abrigo há um bom tempo e as casas estavam vazias. Morei três meses lá e fomos colocados para fora. Então voltei para cá, mas a minha casa está condenada a desabar”, explicou.

Segundo os beneficiados do Conjunto Amaro Félix, muitas casas do programa estão fechadas, sem moradores, foram destinadas a pessoas que já residiam em outras casas ou são alugadas pelos proprietários. “Tem gente que aluga a casa aqui no Conjunto, que troca por moto. Aqui tem mais casa do que morador. Eu penso assim, que, se a pessoa faz isso, é porque já tinha onde morar, não precisava ser beneficiada. Isso tira a oportunidade de outras pessoas que necessitam de moradia”, comentou a moradora Ivanir Maria dos Santos, que há três anos reside no local.

Ivanir e sua família numerosa moram em três casas no conjunto habitacional, foram devidamente cadastrados pela Secretaria de Assistência Social do município e beneficiados com as moradias, após longos anos morando embaixo de lonas, depois da enchente. “Aqui não pagamos aluguel, a moradia é nossa mesmo. Pagamos água e energia. Agradeço muito por estar aqui hoje, porque a gente não tinha casa, não tinha onde morar. Mas sei que muita gente ainda que devia estar aqui, não está”, reafirmou.

Prefeito diz que é preciso mais casas

O prefeito de Jacuípe, Manoel Marques Júnior (PMDB), que assumiu a gestão da cidade em 2013, confirmou que já recebeu denúncias de que pessoas contempladas pelo programa estariam negociando os imóveis. “Desconheço pessoas ali que ganharam casas já tendo casas. Agora existem casas ali, ocupadas por pessoas que precisavam de moradias, que estão sendo negociadas, isso tem acontecido. Mas a parte que coube à prefeitura foi feita e todas as casas foram ocupadas por pessoas que precisavam”, disse.

Mesmo assim, o prefeito reconhece que ainda existem moradores que ainda estão situados em áreas de risco. “Todas as casas estão ocupadas de acordo com o cadastro da secretaria [de Assistência Social do município], o que não quer dizer que não exista pessoas que ainda estão morando em áreas de risco. Estamos correndo atrás de mais moradias junto ao governo do estado e o governo federal. A solução é fazer outro conjunto habitacional”, afirmou.

De acordo com o coordenador da Defesa Civil Estadual, major Dárbio Alvim, Jacuípe está inserida em uma grande área de risco, já que o rio homônimo, que corta a cidade, é um afluente do Rio Una, situado em Pernambuco. “É um problema essa área, assim como o Vale do Mundaú e do Paraíba. É uma preocupação constante da Defesa Civil, tanto em Alagoas como em Pernambuco, onde o Rio Jacuípe nasce, no Rio Una, e atuamos sempre em parceria. Sempre que chove, estamos em alerta nessa região. Ano passado mesmo o nível subiu muito e o nível do rio sempre sobe muito com as chuvas”, explicou.

 

Fonte: gazetawebmaragogi.com

 

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